“É preciso varrer da mente dos
legisladores a mórbida presunção da fraude. É o medo da fraude que cria a
burocracia que, por sua vez, estimula a fraude, a falsificação e a corrupção.”
Hélio Beltrão
Hélio Beltrão
A burocracia, em sua definição, é o conjunto de rotinas dos
funcionários públicos no exercício das suas funções. Entretanto, guiados pelos
critérios de presunção de desonestidade, tratamos de mudar a compreensão do que
é burocracia.
É comum encontrar documentos com dois carimbos e duas
assinaturas da mesma pessoa, uma atestando o recebimento do próprio documento e
a outra o recebimento do material ou serviço, como é também comum em um mesmo
processo encontrar varias cópias autenticadas do mesmo documento.
Em um sistema gigante como o sistema público nacional o custo
de tantas voltas e tantas garantias é também gigante.
Hoje
nos referimos à burocracia de forma pejorativa referenciando a morosidade e as
exigências exacerbadas no desempenho dos serviços públicos. Todos a
reconhecemos como danosa ao desenvolvimento da nação e perigosa ao poder
público, visto que ao criar dificuldades, muitas vezes intransponíveis, sugere
a negociação e venda das facilidades estimulando a fraude e a corrupção,
cânceres das nossas instituições.
Ora, se a burocracia é fundamental para a proteção dos
processos que se referem aos gastos públicos, para a blindagem dos cofres
contra o mau uso dos recursos e para evitar a corrupção, por que acaba por
tornar-se a maior das suas causas?
Para
compreender é preciso, antes de tudo, aceitar que o processo burocrático falhou
nas suas funções de controle, servindo apenas para criar um Estado caro,
moroso, pesado, arrastado e suscetível a males degenerativos como a corrupção.
Antes que haja um corrupto é
preciso que exista um corruptor. Criar dificuldades intransponíveis não é
forçar o nascimento de corruptores?
O ex-ministro da Desburocratização Hélio
Beltrão defendia veementemente que o Brasil não é rico o bastante para praticar
uma administração baseada na desconfiança e que, presumir a desonestidade dos
cidadãos, além de ser uma atitude absurda e injusta, atrasa e encarece a
atividade governamental. Constatação lúcida e pertinente.
Acreditar
que vivemos em um país onde a população é composta, em sua maioria, por pessoas
empenhadas em burlar as normas e transgredir a lei e obrigar-nos a criar regras
para evitar que isso aconteça é dar ao mundo e a nós mesmos um atestado de
incapacidade pedagógica e social.
Basear
a criação de um sistema público na presunção de um povo desonesto é uma atitude
burra, cara e ineficaz. Precisamos ter a coragem de virar essa página triste da
nossa história e perceber que os bons são numericamente muito superiores aos
maus.
A
antecipação do julgamento sobre o caráter do povo brasileiro dá o tom exato da
desconfiança que paira sobre a capacidade de punição posterior a uma má
conduta, pior, dá sinais de que, talvez, nem nós mesmos tenhamos confiança na
nossa honestidade e bons princípios, baixando de forma irrecuperável a nossa autoestima.
Se nem nós mesmos confiamos nesse povo quem poderá confiar?
Não
existe nada mais barato do que confiar nas pessoas.
Sonho
com um Estado que confie em seus cidadãos. Um estado onde os documentos sejam
substituídos pelas declarações e essas tenham o peso dos documentos. Um Estado
onde a pena seja imputada a quem mente e não a quem diz uma verdade indesejada
por um regramento inexequível.
Este
será o país que Hélio Beltrão idealizou. Este será o Brasil que vai encher
nossos filhos e netos de orgulho.
*Tercio
Garcia é Engenheiro Agrônomo, SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO DA
PREFEITURA DE LIMEIRA, foi Prefeito de São Vicente por dois mandatos, Presidente
do Comitê da Bacia Hidrográfica da Baixada Santista por dois mandatos e
Presidente do Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista.
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